O capital humano cresceu 2,2% ao ano no Brasil entre 1995 e 2023, de acordo com estudo do Instituto Brasileiro de Economia (FGV IBRE). Ao elaborar o primeiro Índice de Capital Humano (ICH), baseado em um longo período de tempo e contextualizado para a realidade brasileira, a pesquisa também aponta que este fator foi o principal responsável pelo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país.

Para alcançar os resultados, os pesquisadores cruzaram dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que possuem informações sobre salário e educação dos brasileiros.

A pesquisadora Janaína Feijó explica que o capital humano caracteriza a forma como as pessoas acumulam conhecimentos e habilidades, e para desenvolver este Índice, os pesquisadores analisaram o impacto da escolaridade e da experiência profissional no salário dos trabalhadores brasileiros.

“É muito difícil mensurar o capital humano, e sempre foi um desafio para os economistas conseguir materializá-lo. No Brasil, existe uma lacuna de índices de capital humano, pois apesar de haver alguns organismos internacionais que mensuram este valor, acabam por deixar de fora algumas particularidades da economia de cada um dos países”, disse Feijó, ressaltando que o país passou por grandes mudanças na escolaridade durante as últimas décadas e que o objetivo do novo ICH é analisar o impacto dessas mudanças na qualificação da mão-de-obra brasileira.

Diante do aumento de acesso à educação no país, Fernando Veloso, pesquisador do FGV IBRE e coordenador do Observatório da Produtividade Regis Bonelli, detalha que a pesquisa levou em consideração não somente a expansão da educação, mas também a experiência profissional e as horas trabalhadas dos brasileiros ocupados. “Calculamos o impacto da escolaridade e experiência no salário dos trabalhadores, extraindo um indicador de produtividade que combina a escolaridade e a experiência, juntando esses dados para construir o Índice de Capital Humano”.

Decomposição do crescimento econômico brasileiro

Para realizar a decomposição do crescimento econômico no Brasil, economistas costumam utilizar uma metodologia chamada “função de produção”, que relaciona o PIB com diferentes fatores, tais como o capital físico, caracterizado por máquinas, equipamentos e prédios, e as horas trabalhadas. Porém, Veloso diz que é pouco comum no Brasil calcular o capital humano como um componente desta função de produção de forma isolada.

“No nosso país, o capital físico e as horas de trabalho são a base da mensuração de crescimento econômico. Porém, o capital humano costuma ser incluído na Produtividade Total de Fatores (PTF), que também engloba diversos componentes, como eficiência econômica e tecnologia. A diferença do nosso estudo é que ele analisou o capital humano de forma separada, em uma série longa. Não temos conhecimento de nenhum outro estudo que já tenha feito essa mensuração no Brasil desta forma”, declara.

Segundo o pesquisador, apesar dos desafios no setor da educação, o capital humano vem crescendo consistentemente desde 1995. Além disso, ele ressalta que a população brasileira passou pelo bônus demográfico, ou seja, aumento da população apta a trabalhar.

“Muitas vezes o debate sobre a educação vai mais para o lado negativo, o que faz questionar se os investimentos feitos nas últimas décadas realmente valeram a pena. Apesar dos problemas, nosso estudo demonstra que investir em educação contribui para o crescimento do capital humano e, consequentemente, para o crescimento econômico do país”.

Capital humano em alta e PTF em queda

Feijó explica que a PTF mensura a contribuição da eficiência econômica e da tecnologia para o crescimento econômico. “Um exemplo é a utilização das inteligências artificiais pelas empresas. Este índice se caracteriza pela soma dos fatores residuais para além do capital físico e das horas de trabalho, principais itens analisados em estudos de crescimento econômico.”

Ao analisar o capital humano de forma isolada, os pesquisadores constataram que a Produtividade Total dos Fatores, que nos cálculos convencionais apresenta baixo crescimento, na realidade está em queda nas últimas décadas. “Isso ocorre porque anteriormente o capital humano era calculado dentro da PTF, mas quando o analisamos de forma isolada, ficou perceptível a queda no índice que mede a eficiência econômica e o grau de tecnologia do país”, contextualizou Veloso.

E ele acrescenta: “Quando incorporava o capital humano, que é uma variável que cresceu ao longo dos anos, a PTF demonstrava crescimento. Quando tiramos o capital humano e o analisamos de forma isolada, a PTF demonstra estar em queda nas últimas décadas, o que evidencia a piora do desempenho em eficiência econômica no país, ainda que o capital humano esteja em constante crescimento”.

Para Veloso, uma das hipóteses que explica a queda do PTF é a complexidade do ambiente de negócios, incluindo o sistema tributário: “Se temos um sistema que estimula empresas a produzir em locais distantes do centro consumidor, estamos reduzindo a eficiência econômica. Isso gera uma ineficiência, pois as decisões das empresas deveriam se basear em outras questões como perspectiva de demanda, tamanho do mercado e qualidade dos profissionais, mas com um sistema tributário complexo, você piora a eficiência e assim impacta na PTF. Por isso, inclusive, existe a proposta de Reforma Tributária no Congresso, que pode melhorar esta situação”.

Recomendações e impacto em políticas públicas

A pesquisadora Janaína Feijó acredita que se há evidências de que o capital humano é crucial para o crescimento do PIB, é preciso fomentá-lo mais. “Observamos que nas últimas décadas houve uma ampliação da educação, mas é necessário investir ainda mais para aumentar este capital humano”.

“Nosso estudo gerou um policy paper que orienta a criação de políticas públicas fundamentais para continuar fomentando o capital humano no país, a exemplo de iniciativas para melhorar a qualificação profissional através de mapeamento de vagas e vouchers empresariais, além de desenvolver soft skills e habilidades socioemocionais dos profissionais já empregados. Muitas vezes um profissional já tem a capacidade técnica para exercer uma atividade, mas tem dificuldade de trabalhar em equipe. Este é um fator fundamental em um ambiente que passa por absorção de novas tecnologias capazes de substituir as atividades profissionais operacionais”, afirma ela.

Veloso também ressalta que é necessário investir em melhorar o Sistema Nacional de Empregos (SiNE) para aumentar a eficiência na alocação dos trabalhadores entre as diferentes empresas e setores, o que pode contribuir para o crescimento da PTF.

 

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