Por Agência Gov

O cumprimento das metas do Acordo de Paris para o clima exigirá investimentos de US$ 4 trilhões até 2030. A estimativa faz parte de relatório apresentado há alguns dias pela embaixadora Tatiana Rosito, coordenadora da Trilha de Finanças do G20, nas reuniões do G20 em Belém, no Pará.

O tema ganha importância à medida que cresce a necessidade de recursos para enfrentar a crise ambiental mundial. O Acordo de Paris foi estabelecido na COP21, em 2015. E prevê o engajamento dos países em conter o aumento da temperatura global em não mais que 1,5ºC neste século na comparação com a era pré-industrial (final do século 18). Para isso, o acordo exigiu o comprometimento dos 55 países maiores emissores de gases de efeito estufa. Neste contexto, a participação do setor privado é vista como essencial para preencher essa lacuna e garantir a implementação de tecnologias e infraestruturas sustentáveis.

Em Belém, delegados dos países participantes destacaram essa urgência para o combate às mudanças climáticas e a preparação para a COP30, programada para ocorrer no ano que vem em na capital paraense. Durante uma semana foram discutidos temas como governança ambiental, redução das desigualdades, transição energética, financiamento climático e a necessidade de ações coordenadas entre ciência, conhecimento e investimentos.

Financiamento

Em 2022, países ricos mobilizaram US$ 115,9 bilhões em financiamento climático para o Sul Global, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No entanto, um relatório da Oxfam revela que até US$ 88 bilhões foram prejudicados em negociações climáticas internacionais. A maior parte desse financiamento, quase US$ 92 bilhões, foi provida como financiamento público, mas empréstimos representaram quase 70%, aumentando a dívida dos países em desenvolvimento.

A Oxfam estima que o valor real do financiamento climático fornecido pelos países ricos em 2022 seja apenas entre US$ 28 bilhões e US$ 35 bilhões, com no máximo apenas US$ 15 bilhões destinados à adaptação climática.

Alavancar capitais

A embaixadora Tatiana Rosito destacou dois temas principais: a revisão das ações de combate às mudanças climáticas e a revisão do sistema financeiro global relacionado a esse combate. Ela ressaltou a importância das contribuições nacionalmente determinadas (NDCs), que, embora voluntárias, são essenciais para a ambição climática dos países. Tatiana destacou que, na próxima COP30, em Belém, um novo conjunto de NDCs será anunciado, alinhado aos planos nacionais de desenvolvimento e de investimento.

A ideia é criar plataformas de países que conectem investimentos nacionais e internacionais, envolvendo bancos multilaterais, bancos de investimento e atores privados. “A questão da mobilização de capital privado foi central nas discussões. Há necessidade de usar capitais públicos para alavancar mais capitais privados, dado que os recursos públicos disponíveis são insuficientes. A percepção de risco elevado é um grande entrave, e as discussões focaram em como ajustar essa percepção e mitigar riscos para atrair mais capital”, observou.

A Confederação Nacional de Seguros também participou, apresentando a importância do seguro para catástrofes climáticas, atualmente escasso no Brasil. A reunião contou ainda com apresentações da Standard & Poor’s e do grupo de engajamento B20, abordando temas financeiros críticos para o combate às mudanças climáticas. A embaixadora destacou que todas as apresentações foram bem recebidas, sublinhando a convergência dos temas debatidos e a importância de uma abordagem integrada para alcançar as metas climáticas globais.

Preparativos para a COP 30

Durante a reunião do G20, o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, embaixador André Corrêa do Lago, enfatizou a importância de chegar à COP30 com a mensagem de que as florestas são uma solução para as mudanças climáticas. Ele destacou as oportunidades que cidades como Belém e regiões amazônicas oferecem para o benefício global, ressaltando a necessidade de integrar ciência, conhecimento e investimento.

“Apesar das recomendações do Acordo de Paris, as mudanças climáticas têm ocorrido mais rapidamente do que o previsto, com efeitos esperados para 2040 já se manifestando”, disse Lago. Ele destacou a urgência da situação, apontando que a ciência está alarmada com a velocidade das mudanças e que as previsões mais pessimistas estão se concretizando.

Adriana Moreira, representante do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), instituição global criada em 1991 que oferece financiamento para projetos ambientais como biodiversidade e mudança climática, falou da importância da presidência brasileira do G20 em mobilizar uma ação global contra a mudança climática.

Segundo ela, esta é uma iniciativa inovadora que junta a questão climática ao financiamento internacional, um ponto central para enfrentar o desafio global das mudanças climáticas, que afetam todos os países e exigem soluções conjuntas.

Adriana enfatizou a grande contribuição dos fundos climáticos no debate sobre a mudança climática. O GEF, sendo o fundo climático mais antigo e criado no Rio de Janeiro durante a Rio-92, tem financiado diversos programas emblemáticos no Brasil, como a conservação da floresta amazônica e o desenvolvimento de cidades sustentáveis.

A fusão de questões de biodiversidade, mudanças climáticas e degradação de terras no Brasil torna o país um local ideal para a atuação do GEF. “O fundo opera com alocações definidas a cada ciclo de quatro anos, com os países aplicando esses recursos de forma estratégica. Além disso, o GEF realiza reuniões semestrais do conselho para definir o uso dos recursos, que são esgotados a cada seis meses”, relatou.

União Africana no G20

A entrada da União Africana no G20 marcou um passo significativo na inclusão regional e na representação econômica do continente africano em fóruns globais. Esta participação busca ampliar a voz dos países africanos em decisões econômicas internacionais, promover oportunidades de crescimento sustentável e mitigar desafios como a pobreza e a desigualdade.

A presença da União Africana no G20 reflete o reconhecimento da importância estratégica da África no cenário econômico global. Cecilia Bernardes, representante de Angola, país do sul da África convidado para a Força-Tarefa do Clima, expressou satisfação com a participação angolana, enfatizando o aprendizado e a oportunidade de compartilhar opiniões com membros do G20.

De acordo com ela, as expectativas de Angola incluem ver o G20 liderar o processo de recomendação para influenciar negociações climáticas e outros processos multilaterais. “Angola espera que o G20 se comprometa a fornecer apoio e capacitação aos países do sul global, facilitando o acesso a financiamentos sustentáveis”, declarou.

Bernardes mencionou que a recente reunião em Manaus abordou a importância dos pagamentos por serviços ambientais como uma nova fonte de recursos para combater as mudanças climáticas. Ela disse ainda que Angola, com sua floresta tropical, participa de iniciativas de proteção ambiental, como a transformação de parte da floresta em uma área de conservação para impedir o desmatamento e preservar a biodiversidade.

A iniciativa da Bacia do Congo, liderada atualmente pela República do Congo, é um exemplo de colaboração regional na proteção das florestas. Angola faz parte dessa iniciativa e espera que as recomendações do G20 possam proporcionar lições valiosas para aprimorar esses esforços de conservação.

Práticas sustentáveis

Ainda sobre o tema de financiamento climático, Ivan Oliveira, coordenador do Grupo de Trabalho de Finanças Sustentáveis, avaliou que as reuniões mostraram avanços significativos em quatro prioridades estabelecidas pela presidência brasileira. As discussões focaram em melhorar o acesso aos fundos climáticos, definir critérios para transições justas, promover transparência empresarial e desenvolver soluções baseadas na natureza.

O coordenador informou que em Belém foi apresentado o primeiro relatório do grupo de especialistas independentes, que propôs recomendações para melhorar a alocação de recursos aos projetos. Essas recomendações visam revisar procedimentos políticos, organizar melhor os fundos e eliminar competições desnecessárias entre eles.

“Espera-se que, com a aprovação do relatório e a implementação das propostas, os recursos cheguem de forma mais eficiente aos países em desenvolvimento. A ênfase foi colocada na transparência das ações empresariais, especialmente em relação aos custos para pequenas e médias empresas em países em desenvolvimento. A transparência é vital para garantir que as empresas estejam verdadeiramente comprometidas com práticas sustentáveis”, afirmou.

Investimentos

As soluções baseadas na natureza foram um dos temas centrais. Foram discutidos mecanismos financeiros para facilitar investimentos nessa área, essencial para Belém e o Brasil. A reunião propôs 12 instrumentos financeiros para ampliar esses investimentos, que serão disponibilizados em um site para ajudar os países a replicar ou usar esses instrumentos em seus próprios projetos.

O encontro, na capital do Pará, também preparou o caminho para a próxima reunião no Rio de Janeiro. O objetivo é garantir que todas as entregas sejam fechadas e que os planos de implementação sejam práticos. Espera-se que, a partir do próximo ano, os recursos dos fundos climáticos cheguem de forma mais eficaz aos projetos de transição climática nos países em desenvolvimento.

Atualmente, estima-se que os fundos climáticos globais terão cerca de US$ 30 bilhões nos próximos anos, sendo fundamental garantir que esses recursos cheguem efetivamente aos projetos locais. “Revisar a arquitetura desses fundos é crucial para garantir a eficácia do financiamento climático”, avaliou Ivan.

A reunião em Belém ainda reforçou a liderança brasileira em promover soluções sustentáveis e criar novas temáticas dentro do grupo de Finanças Sustentáveis, marcando um passo importante na trajetória de desenvolvimento sustentável global.

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